sábado, 28 de fevereiro de 2009

Bebedouros (da Série "Úteis & Fúteis")





Reflexivamente reluzente e belo em sua saciadora letargia, a refletir em sua chapa de aço inoxidável as imagens dos homens inoxidáveis que, malgrado ir e vir e vir e ir, declinam apáticos e patéticos quando se inclinam em sedenta reverência, com seus ternos alinhados e suas gravatas em forma de forca, a bebericar o manancial de líqüido aquosamente fluoretado, colhido em meio à profusão de lixo residencial e industrial, peixes mortos sufocados e excrementos humanos e animais, ainda que, de quando em quando, uma menina bonita - sorri, metalicamente terno - ou uma linda mulher concupiscentemente decotada - curto-circuito! fogo! - debrucem-se sobre ele.

Carlos Cruz - 16/02/2009

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

O Encantador de Serpentes





Graças aos reiterados elogios, exclusiva e curiosamente advindos de pacientes do sexo masculino, o hipnoterapeuta gay recebe o "Psi de Ouro", o prêmio máximo da psicoterapia. Finda a cerimônia, um risonho convidado, ex-paciente do terapeuta do ano, expõe ao interessado repórter as razões de sua satisfação com o eficaz tratamento: "Não conseguia dormir, tinha horríveis pesadelos. Logo na primeira consulta com Dr. Aristides, percebi algo diferente ao despertar do transe hipnótico. Saí leve do consultório, como se os fluidos maléficos, que impediam meu sono, tivessem sido sugados de meu corpo; tinha uma dorzinha chata no saco, é verdade, mas logo cessou. Passei a dormir como um anjo, nunca mais tive pesadelos, apenas sonhos deveras agradáveis com a Juliana Paes... Dr. Aristides sempre aparece nos meus sonhos, todo sorridente. O mais engraçado é que nunca achei a Juliana Paes uma mulher sexualmente interessante..."

Carlos Cruz - 15/02/2009

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Trema, alcaguete!





Embora tremendamente assustado, embora não pudesse evitar o tremor de suas pernas e mãos, embora o suor copioso despencasse testa abaixo e lhe embaçasse a visão, embora a luz tremeluzente emitida pela balouçante lâmpada suspensa no centro da cela obscurecesse ainda mais suas esperanças de sobrevivência futura, embora desejasse ardentemente ir embora, embora silenciosamente maldissesse a voz de sua consciência que o persuadira a confessar sua condição de mandante e, de quebra, a delatar o mercenário pistoleiro que lhe restituíra a honra devidamente lavada com o sangue da adúltera sórdida e do amigo hipócrita, o velho gramático não pôde deixar de pensar na famigerada reforma ao observar o malfadado cartaz de más-vindas que, da parede, aflitivamente tremulava a inexorável e irrecorrível sentença: "Alcaguete merece cacete!"

Carlos Cruz - 15/02/2009

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

O Terceiro Olho ou Exame de Vista (Poema Concreto Místico-Proctológico)





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Carlos Cruz - 21/08/2007

Obs. Tive de lançar mãos dos hífens em virtude de minha total ignorância "informatativa".